domingo, 24 de outubro de 2010

Fabrício Cunha: Diário de um brasileiro em Lausanne III

Manhã

Começamos o dia lendo o capítulo 3 de Efésios no pequeno grupo. Francisco fica extremamente animado com o texto e faz excelentes comentários, ao que Dionísio relata o que viveu no domingo, quando foi a uma igreja evangélica aqui em Cape Town e percebeu que brancos se sentavam de um lado e os negros de outro. Foi convidado para tomar um chá depois da celebração. Aceitou. Percebeu que no salão do chá, só havia brancos. Saiu para dar uma volta e viu que a igreja tinha um outro salão onde os negros estavam reunidos. Uma lei pode ser mudada com radicalidade e certa rapidez, mas uma cultura, sem ações de intervenção, pode levar décadas. Paulo, em Efésios 3, anuncia o Evangelho da inclusão, onde todos são igualmente parte de um mesmo corpo e herdeiros dos mesmos benefícios. “Por isso Paulo anuncia seu ministério entre os gentios com tanta ênfase e alegria”, acrescenta Francisco. Corro o risco de ser repetitivo, mas quero transferir para vocês o quanto a experi6encia em grupo pequenos tem sido rica. Em minha opinião, ela divide a primazia do congresso com os testemunhos de irmãos da igreja perseguida e sofredora.



John Piper é o pregador de hoje, fez uma exposição do texto do dia. Fiquei impressionado com seu jeito Didático e empolgado de expor. Entretanto, o conteúdo foi, para mim, decepcionante. Fazemos muito do que ele fez. Repetimos lógicas que só fazem sentido dentro do quadrado evangélico mas que, enunciadas em qualquer outro contexto, demandariam muita explicação, para não dizer repulsa. Reenfatizou o conceito de Anselmo da Cantuária sobre o sacrifício de Cristo, fazendo-o como quem acabou de descobrir esse conceito e como se fosse a única forma possível de se interpretar a cruz. Repintou a linha que separa a evangelização da ação social com declarações sutis como: “precisamos salvar as pessoas de sua condição de pobreza MAS, PRINCIPALMENTE, da condenação eterna”. Alem disso, cometeu a indelicadeza de querer “consertar” a pregação de ontem, quando abriu parêntesis em sua pregação e recorreu ao texto exposto por Ruth Padilla dizendo que se não o interpretássemos direito, correríamos o risco de não entender o Evangelho. Para não dizer que em nada aproveitei, ele falou sobre o sofrimento de Paulo, lembrando de da dimensão sacrificial de nossa fé, dizendo que ninguém escolhe sofrer, mas só se exulta ao sofrer aqueles que são cheios de um poder sobrenatural e o caminho de tal enchimento é a oração.

O programa seguiu com um testemunho sobre o qual falarei na sessão “A HISTÓRIA”

A plenária II, teve como tema “Testemunhando o amor de Cristo a pessoas de outras crenças”. Eu esperava abordagens com ênfase mais catequética e conquistadora. Acho que estou “escaldado”. Mas fui surpreendido com boas exposições e testemunhos, enfocando o amor como o pressuposto básico para um bom dialogo com pessoas de outras fés. Um senhora muçulmana apresentou um trabalho com enfoque na justiça em favor da mulher muçulmana que foi especialmente marcante. E ela sabe muito bem do que está falando, pois já foi vítima dessa violência.

O alemão Michael Randsem nos chamou a atenção para nosso testemunho cristão. Uma vez, conversando com um amigo, disse que se descobrisse que só teria pouco tempo de vida, testemunharia como ninguém, ao que o amigo respondeu: “se você depende de alguma circunstância para ser uma testemunha, ainda não entendeu o valor do Evangelho”. Nosso chamado é para vivermos evidenciando a vida de Cristo por amor e convicção, até as últimas conseqüências e não por expectativas nossas ou alheias ou mesmo por demandas missionárias. Evangelho é o anuncio vivo das boas novas e demanda tudo o que somos e temos.

O que mais me impressionou, foi o jovem árabe Ziya Meral. Apresentou um projeto de inserção no mundo muçulmano, usando como critério não os índices de “conversão”ou de quantidade de “cristãos” mas os índices sociais. Disse que precisamos mudar de paradigma de missão e levar para o mundo muçulmano o que lhes falta em justiça, educação, tecnologia, em vistas de sua emancipação social para que, autônomos, possam decidir sozinhos.

Tarde

O Bispo Robinson Cavalcanti, responsável da Diocese Anglicana do Recife, apresentou um seminário sobre os “Evangélicos e a política no Brasil”, sua especialidade. Em período pré-eleitoral, foi um tempo excelente de orientação. Tivemos também a presença de congressistas de outros, interessados numa avaliação geopolítica.

Noite

O renomado pastor presbiteriano de Manhatan, Tim Keler, foi o preletor principal da noite. Apresentou sua tese do porquê devemos concentrar nossos esforços em missão na cidade. A abordagem teve dois momentos onde, em primeiro lugar, ele apresentou dados para subsidiar sua tese. Disse, por exemplo, que a economia tende cada vez mais a se basear nos índices das grandes cidades do que nos dos países. Hoje, cem cidades já concentram 30% da população mundial. Em segundo lugar, fez uma exposição do livro de Jonas. Talvez pelo tempo, foi muito superficial e disse simplismos como: “Deus prefere as cidades em relação ao campo, porque nelas está a maior quantidade das pessoas que carregam a sua imagem e semelhança”.

A noite foi de temática Latino-americana e, para honrarmos nossa fama, foi alegre e uma bagunça.

Terminamos com um dialogo de 12 minutos entre René Padilla e Samuel Escobar, nos contando um pouco do histórico dos encontros internacionais e regionais do Comitê de Lausanne e da participação efetiva dos latinos nesses processos de construção. Ter dois homens como esses, sentados diante de um público global, mas dispondo somente de 12 minutos é um disparate, alem do que é a expressão de como os latinoamericanos têm sido considerados dentro do programa.

Mesmo assim, René Padilla usou o final de seu tempo para chamar a atenção de todos para temas que o preocupam. Acho que era exatamente isso que o Comitê Internacional temia pois pediram p[ara ler o que ele falaria no púlpito. Imaginem. Dão 6 minutos para ele e ainda querem ler o que ele vai falar. Disse: “preocupa-me tratarmos a globalização como um fenômeno normal. Ele só é normal para os ricos que oprimem os pobres e a natureza pelo seu furor em consumir. Preocupa-me o tema da ecologia. Se não o trouxermos para nossa pauta principal, não teremos mundo para nossos netos. Por último, preocupa-me o discurso de que queremos alcançar o mundo convertendo as pessoas. Jesus não espera convertidos, ele espera discípulos.”

Foi aplaudido de pé.

A HISTÓRIA

Um casal de missionários no Oriente Médio viajava de uma cidade para outra. Pararam no posto. Ela viu um senhor caminhando de um lado para outro, barba grande, arma nas costas. Ficou incomodada e resolveu entregar uma Bíblia para ele. Conversou com o marido que, imediatamente a repreendeu. Ela insistiu mas não foi atendida. Pouco depois de saírem, ainda sem nenhuma paz, ela pede para o marido parar o carro e lhe diz: “eu quis fazer a minha parte. O sangue desse homem não está sobre mim, mas sobre você…” O marido, contrariado mas constrangido com a palavra de sua mulher, dá meia volta, chega novamente ao posto, despede-se da mulher, com a certeza de que corre risco de vida, e vai na direção do homem, com a Bíblia nas mãos. Quando aborda o senhor e lhe entrega a Bíblia, o homem a recebe a abraça e a beija. Conta: “há três dias estou nessa cidade pois sonhei com um homem muito poderoso, que me disse para caminhar até aqui e esperar uma pessoa me entregar a Palavra da Vida”.

Não acredito que sangue recaia sobre nós, mas acredito no incômodo daqueles que são cheios do Espírito e que podem participar de processo sobrenaturais desse mesmo Espírito. É isso o que quero para minha vida e de meus irmãos Senhor. Quero participar do que estás fazendo no mundo.

A PESSOA

Lilby e Tom Little vivem em Kabul há 30 anos. Ele é dentista e organiza projetos nos finais de semana junto com outros profissionais em comunidades de vilarejos carentes do Afeganistão. Organizou mais um no último mês. Ligou para sua esposa Lilby dizendo que tinha sido muito difícil pois o carro não havia chegado ao local e tiveram que acampar na chuva e depois caminhar alguns quilômetros com todos o equipamento. Trabalharam o dia todo e continuaram caminhando até chegar à casa do pastor que os receberia. Uma das jovens teve sérias feridas nos pés. Chegando à casa, um amigo a estava ajudando a limpar as feridas, quando um pastor afegão aproximou-se emocionado e começou a dizer: “poecha makabul, poecha, makabul”, que quer dizer “formosos são os pés, formosos são os pés.”

Trabalharam novamente no dia seguinte. Tom ligou novamente, dizendo que já estavam saindo e que chegaria em casa no início da noite. Nunca chegou. Ele e mais 14 pessoas foram assassinadas a caminho de Kabul.

Quando o FBI foi avisar Lilby, levou alguns dos pertences de Tom, dentre eles, o caderno sujo de sangue, onde estava suas impressões do projeto e o devocional que tinham feito na noite anterior. Os textos eram Efésios 2. 10 e “somos o bom perfume de Cristo”.

“Não sei por qual motivo eles foram assassinados e talvez nunca saberei, mas sei qual foi o motivo pelo qual entregaram suas vidas. O preço que pagamos não é maior do que o amor de Cristo por nós e pelo povo Afegão, por quem Ele se entregou” disse Lilby com a voz embargada. “Tem sido difícil sem meu Tom, mas ele combateu o bom combate, completou a carreira e guardou a fé”.

O sangue de Tom, nas páginas daquele caderno, é a assinatura mais autêntica de alguém que viveu e morreu por Cristo e por seu povo.

UMA OPINIÃO

Seria de bom tom colocarem um testemunho de algum cristão afegão, que teve o testemunho de sua fé comprometido por conta da invasão do exército americano em seu país. Só uma opinião…

Fabrício Cunha é pastor de Jovens da Igreja Batista da Água Branca e esta em Cape Town participando do Congresso Internacional de Evangelização Mundial Lausanne III

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